Definindo uma função

From Applied Science

Uma função é uma regra que associa um conjunto de elementos com outro (há maneiras mais rigorosas de definir mas por agora basta isto). Temos um conjunto D onde cada um de seus elementos esta associato com outro elemento de um outro conjunto, o E. O conjunto D é chamado de Domínio da função e o conjunto E de contradomínio da função. Cada elemento de D é chamado de entrada ou variável independente e cada elemento de E é chamado de saída ou variável dependente.

Caso o termo dependente cause confusão quando temos uma função constante. Isto é, uma função que produz o mesmo valor para qualquer entrada. A função constante só pode calcular um valor se uma variável de entrada existir, qualquer que seja. Sem valor de entrada a função não tem saída nenhuma.

Para várias variáveis a definição de função é a mesma. Exceto que agora temos uma questão adicional: as variáveis independentes são independentes entre si? Em cálculo sim. Mas podemos muito bem pensar em muitas situações onde as variáveis independentes guardam alguma dependência entre si. Para tudo que aprendemos em cálculo, [math]\displaystyle{ f(x,y) = x + y }[/math] por exemplo. Considerando o domínio da função, os valores de cada par [math]\displaystyle{ (x,y) }[/math] não tem nenhuma dependência entre uma variável e a outra. Em álgebra linear esta independência de variáveis é o conceito de dependência linear.

(Não, a entrada e a saída não precisam ser do mesmo tipo)

A flecha é uma forma bem intuitiva de mostrar que os elementos de D são levados a elementos de E. Note que cada elemento de D deve corresponder a algum elemento de E. Se houver algum de D que não, então ele não faz parte do domínio. Note também que cada [math]\displaystyle{ x }[/math] corresponde a um [math]\displaystyle{ f(x) }[/math], o que significa que são todos pares ordenados [math]\displaystyle{ (x, \ f(x)) }[/math]. Ordenados porque, como a flecha indica, a direção importa. Você não pode simplesmente escrever um par em qualquer ordem porque fazendo isto você estará destruindo a relação dos elementos.

Notação: [math]\displaystyle{ f \ : D \ \to \ E }[/math]. Na maior parte do tempo não precisamos escrever isso e escrevemos apenas [math]\displaystyle{ f(x) = x^2 + 3x - 5 }[/math] porque é bastante óbvio pela própria equação que representa a função quais são os conjuntos D e E. Quando traçamos o gráfico de uma função não importa se o eixo vertical for chamado de [math]\displaystyle{ f(x) }[/math] ou [math]\displaystyle{ y }[/math]. Apenas é mais comum usar [math]\displaystyle{ x, \ y }[/math] para nomear os eixos (e [math]\displaystyle{ z }[/math] no caso de funções de duas variáveis).

A flecha pode ser invertida? Sim, este é o conceito da função inversa. Porém, nem toda função pode ser invertida e alguns processos não são reversíveis (há muitos exemplos de processos irreversíveis na física e na química). A condição para que uma função seja invertível é que para cada [math]\displaystyle{ f(x) }[/math], corresponde apenas um [math]\displaystyle{ x }[/math], tal que [math]\displaystyle{ x \to f(x) }[/math]. Em outras palavras, de [math]\displaystyle{ x }[/math] vamos à [math]\displaystyle{ f(x) }[/math] e vice-versa. Se acontecer isto [math]\displaystyle{ x_1, \ x_2 \to f(x) }[/math], é impossível saber a partir de [math]\displaystyle{ f(x) }[/math] se partimos de [math]\displaystyle{ x_1 }[/math] ou [math]\displaystyle{ x_2 }[/math]. Ou seja, a função não é invertível.

Uma questão natural sobre as funções inversas: não aprendemos o teorema na escola, mas podemos aprender o significado de uma função inversa. O que fazer no caso de funções de várias variáveis? O conceito é o mesmo, mas entra uma complicação. O domínio de uma função de uma variável (real) é um conjunto de números ordenados. O domínio de uma função de duas variáveis é um conjunto de pares ordenados. Com funções de várias variáveis há infinitos pares ordenados que são levados ao mesmo valor. O que fazer? Não é possível explicar aqui com um parágrafo só.

Uma analogia: suponha que tenhamos uma máquina que processa água, energia, açúcar, aromatizantes e glucose de milho para produzir balas. A máquina só produz balas. Não pode produzir, digamos, bolos com os mesmos ingredientes usados para produzir balas. Por outro lado, se introduzirmos sal, amido de milho e morangos na mesma máquina, ela não produzirá nada porque não foi feita para processar morangos, sal e amido de milho.

Sobre a terminologia: É muito comum o uso indistinto das palavras "parâmetro", "argumento" e "incógnita". Em grande parte das vezes elas significam a variável de entrada. Parâmetro é frequentemente encontrado em equações com interpretação geométrica, porque mudanças no valor do parâmetro mudam o tamanho de um círculo ou a inclinação de uma rampa por exemplo. Na física as variáveis frequentemente carregam um significado, como por exemplo mudar a taxa de variação de algo. Um exemplo prático seria uma equação que descreve a transparência de um material. Ele pode ser mais ou menos transparente e esta propriedade é controlada por um parâmetro. A palavra "argumento" é mais comum na matemática para se referir ao argumento de uma função. "Incógnita" por sua vez é sinônimo para "variável" na maioria das vezes. É mais comum quando temos que resolver equações ou sistemas de equações.

Contradomínio e imagem: nos livros em inglês de cálculo é muito comum o termo range para indicar as duas coisas. Em tradução livre seria a faixa de valores produzidos pela função. A palavra domínio não causa maiores problemas. Já contradomínio sim. Em inglês se diz codomínio em tradução livre. Em português o prefixo co foi substituído por contra por algum motivo. Temos o domínio que é o conjunto de entrada e o contradomínio que é o de saída, formando um par de conjuntos onde a função é o que liga os elementos de um ao outro. Quanto ao termo imagem, um dos livros que tenho define que, do par [math]\displaystyle{ (x, \ f(x)) }[/math], o segundo elemento é chamado de imagem do primeiro. Numa interpretação visual, [math]\displaystyle{ x }[/math] é o valor de entrada e [math]\displaystyle{ f(x) }[/math] é a saída que a função produz, algo que podemos ver, num gráfico por exemplo. O conjunto imagem e o contradomínio podem ter a mesma quantidade de elementos, mas a imagem nunca pode conter mais elementos do que o contradomínio. Um exemplo é [math]\displaystyle{ f(x) = x^2 }[/math]. É uma função de valores reais a valores reais. O contradomínio são todos os reais, mas a função não produz números negativos. A imagem é [math]\displaystyle{ \mathbb{R}_*^{+} }[/math].


Examplos
Suponha que temos uma função que aceita qualquer número real como entrada e na saída produz a constante 2. A saída é sempre 2 e nada mais ou menos. O número 4 não pode fazer parte da imagem desta função, mas pode fazer parte do contradomínio.
Agora o problema oposto. Suponha que uma função produz como saída a raiz quadrada de um número real. O que acontece se a entrada for -1? A raiz quadrada de -1 é um número complexo e como a função esta definida para valores reais, nada acontece. Não existe a raiz quadrada de -1 nos reais. Logo, -1 não faz parte do domínio da função.
Pode uma função levar um elemento para mais do que um outro elemento? É impossível! É por isto que o gráfico de uma função não pode formar um laço. O gráfico de uma função de duas variáveis não pode ser uma esfera ou um cilindro. Pense numa situação real. Pode o mesmo ponto do espaço, ao mesmo tempo, ter duas temperaturas diferentes? Pode o mesmo objeto, num certo instante de tempo e numa certa posição no espaço, ter dois valores de massa diferentes? Não vamos entrar na discussão filosófica do significado das medidas.

Se uma função definida por partes (ramos em Portugal) tiver casos sobrepostos esta errado. Se for um algoritmo num computador, o mais comum é a execução do primeiro caso satisfeito.

Métodos numéricos: frequentemente temos dados experimentais na forma de pontos com pares de coordenadas [math]\displaystyle{ (x,y) }[/math]. Às vezes não há um padrão óbvio e os dados parecem aleatórios. Porém, se os pontos mostram um padrão, provavelmente há uma função e para descobrir qual é temos que recorrer aos métodos numéricos para encontrar a melhor função para aquele caso. Dependendo do caso precisamos dividir o gráficos em partes menores porque apenas uma função não vai conseguir descrever todos os pontos, mas cada parte é uma função diferente.

A estatística também tem a sua parte na aproximação de funções porque sempre há um erro associado com cada medida. Medidas sem erros não existem. Dados do mundo real nunca se encaixam perfeitamente numa curva, o que significa que na maior parte das vezes estamos desconsiderando algumas variações de alta frequência.

Uma questão interessante é se a função precisa ser uma só e, se for definida por partes (ramos em Portugal), o que acontece com os valores que separam uma parte da função da próxima. A resposta depende muito do experimento que você esta conduzindo. Pode ser ou não necessário, ou mesmo viável, uma "ampliação" ao redor de tais pontos para capturar o máximo de detalhes.

Resolver numericamente ou analiticamente? O primeiro significa calcular um valor numérico com uma aproximação boa o bastante da solução verdadeira, o valor teórico. O segundo significa achar uma solução exata ou uma fórmula.

Interpretação física: frequentemente não estamos interessados em todos os valores de uma função, mas apenas uma determinada faixa. Por exemplo: uma função pode representar volume em função de algo. A função em si pode assumir valores negativos. Porém, volume negativo não existe. Outro exemplo: velocidade no tempo. Por causa das leis da física a velocidade não pode ser infinita, há o limite teórico da velocidade da luz. Apesar disto o gráfico pode ultrapassar o limite teórico. O que ocorre é que acima ou abaixo de um certo valor a função perde a interpretação física. Aí entra a matemática pura, onde a interpretação física não existe mais.

Funções a partir de pontos: Na maior parte do tempo em cálculo a função já é dada. Em muitos casos a função é desconhecida, mas conhecemos os pontos. Se os pontos forem ordenados numa tabela, padrões numéricos ficam fáceis de reconhecer. Padrões fáceis como oscilações periódicas, crescimento constante, crescimento exponencial ou decrescimento exponencial por exemplo. Se um padrão claro não for reconhecido, marcar os pontos num plano cartesiano pode trazer uma luz ao problema. Isto é mais ou menos um exercício de adivinhar qual função melhor aproxima o comportamento observado.

Na física experimental já sabemos a função na maior parte das vezes. As aulas não são sobre adivinhar qual função é. Os experimentos já partem de uma função conhecida e o objetivo é mais sobre verificar os limites da teoria, até onde a função continua sendo um bom modelo para os dados coletados. Nestes experimentos há um pouco de estatística porque na base de tudo dependemos da análise de erros.

Em termos práticos os dados coletados podem mostrar um comportamento bizarro. Aí entra o conhecimento sobre o fenômeno estudado para identificar os comportamentos fora do padrão. Por exemplo: a velocidade do som no ar é conhecida. Se temos uma tabela e um ponto indica uma velocidade excessiva. Ou aquilo significa que o dado esta errado ou que alguém inseriu um dado que não deveria estar ali. A causa do erro pode ser um erro na coleta por exemplo. Para a estatística estes pontos podem ser interessantes, porque podem representar um pico ou desvio. Uma alta na taxa de crimes por exemplo.